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Descartáveis: Problemas e soluções para os resíduos de uso único.

Desde o final de 2019 o mundo está de olhos atentos ao surgimento do novo coronavírus. Nossas rotinas tiveram de ser repensadas por conta da pandemia e as novas exigências do momento: isolamento social, fechamento do comércio e shoppings, bloqueio em aeroportos, hospitais expandindo leitos, utilização de máscaras para proteção individual.

Com a necessidade de produzir mais produtos de uso único, seja para atendimento hospitalar ou para que as pessoas se locomovam com o mínimo de segurança, houve o aumento significativo na produção de descartáveis, e sabendo que esses produtos em sua grande maioria são feitos a base de plástico, um outro alarme soou para indústrias e consumidores.

Não é de agora a preocupação com a extração, produção e descarte de derivados do petróleo. São incontáveis os documentários e reportagens que nos mostram o grande impacto provocado pela destinação incorreta desses resíduos, que em grande parte acaba parando na natureza.

Como vem operando a indústria de reciclagem neste momento de maior demanda por produtos derivados de petróleo? Como lidar de forma eficiente e ecologicamente correta com a grande quantidade de novos plásticos sendo produzidos? Quais podemos substituir? 

Não há respostas fáceis e imediatas para essas e outras questões, mas precisamos elucidar com dados e pesquisa o que vem acontecendo e quais medidas nos apontam para melhores soluções.

 


Impacto dos plásticos de uso único – no mundo e no Brasil


O relatório geral feito pela Oceana, apontou que o consumo de polímeros fósseis, ou seja, derivados do petróleo, cresceu mais de 20 vezes nos últimos 50 anos. Isso quer dizer que uma quantidade abundante de carbono estocado foi extraído da natureza e processado. Importante apontar que mais da metade de todo o plástico consumido no mundo foi produzido depois de 2005, e este insumo é usado principalmente em embalagens e produtos de uso único.

Outro dado alarmante: ao ano, pelo menos 8 milhões de toneladas de plásticos vão parar em nossos oceanos, um equivalente a um caminhão de lixo despejado por minuto em nossos mares. O relatório indica que, se continuarmos nessa trajetória, o volume de plásticos despejados será de quatro caminhões por minuto até 2050. Neste estágio, a quantidade em peso de plástico no mar superará a de peixes.

Em 27 de março de 2019,o Parlamento Europeu aprovou uma legislação para banir em toda a União Europeia (EU) vários produtos plásticos de uso único, como talheres, pratos, copos, canudos e cotonetes, e qualquer outro descartável plástico em que já existam alternativas feitas de materiais ecológicos. A lei entrou em vigor já no início de 2021.

Por ano, o Brasil gera 11,3 milhões de toneladas de lixo plástico, sendo o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo, perdendo apenas para EUA (70,8 milhões), China (54,7 milhões) e Índia (19,3 milhões), segundo relatório internacional da Global Plastics Report, em levantamento feito pela WWF.

De acordo com o Projeto Marplast, 90% do lixo encontrado nas praias e restingas do litoral brasileiro são resíduos plásticos: tampas, garrafas, embalagens de comida, sacolas plásticas, derivados de cordas e cabos, hastes flexíveis, esponjas, espumas, espumas vinílicas acetinadas – EVAs, copos e embalagens de isopor e boia de isopor e fragmentos.



Plásticos de uso único são banidos da cidade de São Paulo

 

A Câmara Municipal de São Paulo sancionou no dia 13 de janeiro de 2020, lei que proíbe o fornecimento de talheres, pratos, copos e outros tipos de plásticos de uso único na cidade.

Xexéu Tipoli (PV), autor do projeto, afirma que “a lei é extremamente importante não apenas por conta da redução de lixo na cidade, mas também para difundir o tamanho do problema que esses materiais podem trazer para o planeta”. A lei passou a valer já para janeiro de 2021.

Em concordância com o projeto de lei acima, um outro está tramitando na esfera federal. A PL 4186/20 proíbe a comercialização e o uso no país, a partir de 2022, produtos plásticos de uso único. O projeto segue em tramitação no Congresso Nacional.



Pandemia, compras online e delivery

 

Joe Brock, jornalista da Agência Reuters, divulgou em outubro de 2020 uma reportagem especial com levantamento de dados e entrevistas, mostrando o quanto a indústria de reciclagem de polímeros retraiu diante da pandemia do coronavírus.

Com o aumento da demanda global por luvas, protetores faciais e máscaras descartáveis, além de embalagens para entrega de comida via delivery e compras online, a guerra de preços entre a indústria de reciclagem e a de novos plásticos – que é comandada pela indústria de extração de petróleo – cresceu durante a pandemia.

Segundo a reportagem, garrafas que antes eram feitas de plástico reciclável, passaram a se tornar mercadologicamente inviáveis, já que o custo do plástico reciclado é de 83% a 93% mais caro.  

“A pandemia atingiu quando políticos em muitos países prometeram travar uma guerra contra os resíduos de plásticos descartáveis.”, afirma Joe. A indústria do petróleo pretende gastar 400 bilhões de dólares em novas plantas para a criação de mais plásticos de uso único, enquanto o gasto para a indústria de reciclagem atinge apenas 2 bilhões de dólares em investimentos.

Durante a pandemia da Covid-19, passamos cada vez mais tempo em casa, e com isso, mudamos nosso método de consumo e passamos a comprar mais através de aplicativos e pela internet.

Segundo dados do setor de embalagens, de abril a outubro de 2020, muitas indústrias brasileiras expandiram sua produção. As embalagens hoje encontradas no mercado podem estar custando até 20% a mais se comparados com o mesmo período de anos anteriores. De acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais – ABREPE, a coleta de materiais recicláveis durante a pandemia teve um crescimento de 25% a 30%.

A produção do papelão ondulado, aquele usado, por exemplo, para pizzas, ultrapassou 1,7 milhão de toneladas no primeiro semestre de 2020. Levantamento feito pela Indústria Brasileira de Árvores – IBÁ, mostrou que no mês de junho de 2020 houve um aumento da procura por papel para embalagens, e em alguns segmentos o aumento chegou a 25%.

 


Produtos descartáveis, biodegradáveis e compostáveis

 

A história do surgimento do plástico está intimamente ligada ao desenvolvimento humano nas mais variadas esferas. Foi graças ao surgimento e desenvolvimento de materiais plásticos que foi possível criar, por exemplo, discos em vinil e comercializar e armazenar alimentos de forma higiênica, e tornar o ambiente hospitalar, bem como seus inúmeros procedimentos, mais seguros para os profissionais da saúde e pacientes.

Mas como já vimos, esse desenvolvimento teve e tem um custo alto, e portanto, precisamos repensar urgentemente como tratar e destinar de forma correta o descarte de resíduos provenientes do petróleo, além de pensarmos em novos produtos ecologicamente sustentáveis.

Nos dados levantados sobre os resíduos mais encontrados nas praias paulistas, embalagens de comida, sacolas e copos plásticos e fragmentos de isopor, estão entre os grandes vilões. Mas, para eles, já existem alternativas.

A empresa norte-americana Ecovative, desenvolveu um tipo de isopor 100% biodegradável e compostável. Os insumos desse tipo de embalagem são feitos a partir de resíduos da agricultura, como caules de milho e cascas, juntamente a um tipo de fungo, o micélio. O cultivo do fungo é feito diretamente nos moldes e ao final essas estruturas são secas e estão prontas para uso. Essas estruturas são ótimas alternativas para substituírem, por exemplo, o isopor.

Aqui no Brasil, também encontramos empresas preocupadas em comercializar materiais de uso único e ecologicamente corretos. A Qualifest, empresa localizada no município de Jundiaí, comercializa produtos como garfos, colheres, copo e guardanapos, itens indispensáveis nas redes hoteleiras, restaurantes e buffets. Todos os materiais são 100% biodegradáveis e passaram por testes na planta de compostagem da Tera Ambiental. Alguns de seus produtos também podem ser reciclados em composteiras domésticas. Suas matérias-primas são de baixíssimo impacto ambiental, tais como bambu, bagaço de cana, palha de palmeira, lâmina de madeira e celulose, entre outros.  

Como vimos aqui, da mesma forma que o plástico pode ser um grande vilão para a natureza, também proporcionou papel importante no desenvolvimento da humanidade. Quanto aos consumidores e membros da sociedade civil, o papel está cada vez mais claro: cobrar as autoridades e empresas no país a assumirem suas responsabilidades para a proteção e manutenção do meio ambiente, além de consumir e incentivar empresas que trabalham hoje, mas seguem firmes pensando no amanhã.

Por Juliana Mingoti, da Tera Ambiental.